Por Gustavo Coelho
Lá, bem no meio da viela, havia um menino. Nas idas e vindas do cotidiano ordinário daqueles que caminham por ela, olham com olhar apático e incômodo aquele pequeno ser, que só de existir atrapalhava o movimento estático de suas vidas. Mas o que ele poderia fazer, sem qualquer raiz para lhe nutrir, se era órfão, inclusive de pertencimento, não havendo calor ou vínculo pelo qual ele pudesse procurar?
Naquela viela, o menino trilhava um percurso sem rumo, debruçando-se sobre a própria existência, buscando se sustentar das migalhas que ali surgiam. Não havia o menor sinal do horizonte. Estava à margem de sua própria sorte.
No meio daquela vida de mendicância, revirava as latas em busca dos resquícios servidos a outrem e alimentava sua própria carcaça. Ao colocar o alimento putrefato na boca, o corpo agradecia. Mas conforme sua sina o perseguia, aquele que outrora era um companheiro, se transformava no arquitetor sombrio de sua ruína:
__ É meu! Largue, seu pivete, e saia daqui!
Com lágrimas em sua face tecendo sua dor, o menino correu para a vasta metrópole que se erguia bem no fim daquela viela. Naquela sintonia dissonante projetavam-se caminhantes apressados entrelaçados aos murmúrios dos que permaneciam imóveis: caos urbano. No meio de tanta comunhão, uma epifania acometeu o menino, trazendo-lhe uma possível solução. Não se via mais como um ser lastimado, digno de pena e tribulações, pária de tal abandono.
Colheu os frutos para o desenvolvimento de seu sustento primordial, convertendo migalhas em mantimentos capazes de lhe sustentar e, quiçá, oferecer-lhe o vislumbre fugido de uma independência, antes que o fado o reclamasse novamente. Ao findar sua jornada, contemplou os frutos de seu árduo suor. Mas como toda sina perene, ela o chamou estrondosa, e aos gritos replicou o quão tortuosa era sua vida:
__ Me passe a grana, seu moleque, ou sentirá a ponta de meu canivete!
Talvez por medo, ou angústia, houve um breve vacilo. Evitando possível arrebatamento, o menino se contorceu, protegendo o fruto valioso derivado do suor de sua testa.
Agora, ali, no chão, sem aquele fruto na mão, sofria por sua
escolha. Apenas tentara sobreviver em meio ao vasto turbilhão urbano, entre as
sombras do caos. Mas, enfim, sua sina alcançou o acaso, enquanto sua derradeira
expiração se dissolvia em seu último suspiro.
Gustavo
Coelho,
natural do Rio de Janeiro (RJ), reside em Uberlândia/MG. Formado em Comunicação
Social e especialista em Marketing, assim como todo bom nerd, é um apaixonado
pela cultura Geek. Empresário com 45 anos, tem como hobby a contínua busca do
anime perfeito. Casado, pai de uma linda filhota, entra neste mundo mágico da
Literatura buscando expandir, cada vez mais, sua criatividade e imaginação.