17 de ago. de 2020

Entrevista com Bernardo Ajzenberg

 


Bernardo Ajzenberg nasceu em São Paulo, em 1959, formou em Jornalismo e viveu em Paris. Publicou os romances Carreiras cortadas (1989), Efeito suspensório (1993), Goldstein & Camargo (1994), Variações Goldman (1998), A gaiola de Faraday (2002, prêmio de Ficção da Academia Brasileira de Letras), Olhos secos (2009, finalista do prêmio Portugal Telecom), Duas novelas (2011), Minha Vida sem Banho (2014, Prêmio Casa de las Américas 2015), Gostar de Ostras (2017) e o livro de contos Homens com mulheres (2005, finalista do prêmio Jabuti).

Como tradutor, verteu para o português mais de cinquenta obras. Em 2010, ganhou o prêmio Jabuti pela tradução do romance Purgatório, de Tomás Eloy Martínez (Companhia das Letras, 2009). Como jornalista, trabalhou em veículos como Veja, Última HoraGazeta Mercantil e Folha de S. Paulo. Foi proprietário do Sebo Avalovara, coordenador executivo do Instituto Moreira Salles e diretor-executivo da editora Cosac & Naify.

Muito solícito, Bernardo respondeu – na maioria das vezes sinteticamente, como um bom jornalista – as perguntas que lhe foram enviadas por e-mail pela colunista Marcia Barbieri.


Marcia Barbieri – Bernardo Carvalho afirma que a literatura é um antídoto à banalidade. Você concorda com essa afirmação?

Bernardo Ajzenberg – Isso não é privilégio da literatura. Toda forma de arte, toda elaboração científica original e toda ação inusitada, seja ela artística, científica ou não, é antídoto à banalidade.

 

Marcia Barbieri – Qual a influência do jornalismo na sua literatura?

Bernardo Ajzenberg – O jornalismo trouxe o treinamento da observação, a ideia de precisão e a rapidez no trato das palavras. Mas sempre foi também muito perigoso, para minha literatura, o risco de cair na facilidade da escrita. Desde o início, sempre batalhei contra a pressão do texto rápido e direto.

 

Marcia Barbieri – Você usa muito ou pouco da realidade para construir seus personagens?

Bernardo Ajzenberg – Uso muito da realidade. Minha ideia de literatura, a maneira como eu lido com ela – e é assim que ela faz sentido para mim –, é bastante carnal, calcada na experiência da realidade, seja diretamente a minha, seja de outras pessoas ou grupos. Mas isso não quer dizer que eu não fantasie. Ao contrário, a fantasia é essencial para transformar traços de realidade em literatura.

 

Marcia Barbieri – Você acha que a internet banalizou a ideia de escrita? Qual é o papel da literatura nesse contexto?


Bernardo Ajzenberg – A internet de certa forma resgatou o valor da escrita, para o bem e para o mal. Para o bem porque as palavras voltaram a ganhar peso em relação às imagens. Para o mal porque, sim, houve uma banalização, a ideia de que é fácil escrever e “publicar”, sem filtros sociais que considero legítimos e necessários, como são as editoras, os críticos, os pesquisadores.


Marcia Barbieri – O trabalho de tradutor auxilia ou influencia na escrita dos seus romances de alguma forma?

Bernardo Ajzenberg – Muito indiretamente, no sentido de que, ao captar a carpintaria do texto do autor a ser traduzido, acabo descobrindo formas diferentes de criação autoral. Os horizontes se ampliam em relação às possibilidades de escrita ou narrativa. Mas isso não significa que eu adote essas formas nos meus livros.

 

Marcia Barbieri – Você já utilizou a literatura como processo terapêutico?

Bernardo Ajzenberg – Escrevo porque tenho necessidade de escrever. É a melhor forma que sempre encontrei para conversar comigo mesmo, para expor os meus medos, fantasmas, fantasias. Me comunicar. Me encaixar socialmente. Eu publico o que escrevo porque acredito que minhas experiências são as mesmas de muitas pessoas. Os livros dos outros sempre me fizeram bem, no sentido de gerar interrogações, sonhar, abrir novos caminhos, ampliar ideias. Espero que os meus também possam gerar esse tipo de fruição nos leitores. 

 

Marcia Barbieri – Quando você escreve um romance, qual é a sua prioridade: fabulação narrativa ou linguagem?

Bernardo Ajzenberg – Uma não existe sem a outra. Nem mais ou menos que a outra. É como a construção de uma casa, em que você cria os alicerces, as estruturas, mas também as paredes, todo o interior. Fabulação narrativa pura não me interessa; para isso existem os roteiristas. A linguagem pura também não me interessa, e a experiência de transitoriedade breve do Nouveau Roman francês foi, a meu ver, uma demonstração disso.

 

Marcia Barbieri – Alguns dos seus personagens me parecem seres solitários, você é um ser solitário? A solidão é aliada ou inimiga do escritor?

Bernardo Ajzenberg – Não sou uma pessoa solitária. Mas lido bem com a solidão. Ela é indispensável, no meu caso, para escrever. Mas, embora o livro seja produzido solitariamente, o seu recheio é fruto de uma vivência coletiva, partilhada.