Por Adrianna Alberti
Aquilo que nos une
Ela dominava perfeitamente três línguas, embora achasse constantemente que não. Tinha uns olhos brilhantes, como se estivesse deslumbrada com alguma novidade. A mente era obcecada por listas, planilhas, contagens, como se a vida pudesse ser resumida em estatísticas bem colocadas no papel. Eu me perdi entre a crítica feroz e impiedosa que saía de seu raciocínio e a inocência delicada de quem vive distante. Ela era toda um contraste: cores terrosas na roupa, voz suave no áudio, o suporte firme de quem acreditava que eu era alguma coisa, mas o desespero de quem se descontrola facilmente. Mas era roxa, e eu não tinha outros planos.
Animais espirituais
Recordo o bar, lotado, o cheiro de cerveja e suor, o cabelo laranja que se destacava na multidão, sorrisos, apresentações e uma sensação quase automática de que ela era meu animal espiritual. Então, o vestido azul e branco combinava com as cores da fronha do meu travesseiro jogado na sala, as ondas alaranjadas e o braço nos olhos, enquanto arrastávamos nossos chifres: Esse apartamento possui telas para assegurar os gatos e contra a sofrência. O sorriso de sua conquista, enquanto eu a observava do sofá, como amor finalmente. Então já não éramos mais duas, mais três. E meu coração estava em paz.
Algoritmos da vida
Algum algoritmo a inseriu nas minhas indicações de amigos, linda, sorriso misterioso, um corte de cabelo que a deixava poderosa. Em outra rede social, eu a segui sem saber quem era, não ligando nomes, fotos, pessoas. E a admirava secretamente, como uma pessoa que eu nem sei quem é, mas de quem seria amiga. Até que um dia ela apareceu em carne e osso, braços dados com meu ex-namorado e eu tive certeza que toda admiração era justificada. E se eu descobrisse que no final das contas eu iria te conhecer, eu teria feito absolutamente tudo de novo, incluindo o sofrimento. Foi o que eu disse a ela, num dia qualquer, apenas porque eu podia.