Por Milton Rezende
Convidados
Da janela da casa onde moro
aguardo a
chegada de alguns
amigos para
a festa de
aniversário.
Nada se
move, exceto a minha
sombra na
varanda, vazada de
angústia,
silêncio e noite.
Fecho as
janelas da casa
onde moro e
ainda dou
uma última
olhada através
das frestas
da veneziana.
Nada se
move, exceto a noite
com a sua
noção de simultaneidade
do tempo,
das pessoas e das coisas.
Nada se move, exceto o silêncio
que domina o
ambiente e repousa
na visão do
telefone emudecido
e inútil
sobre o criado-mudo.
Fecho a
porta do meu quarto
e a casa
onde moro fica escura,
imersa na solidão dos cômodos.
Exílio sem
reino
Caminho pelas ruas de
uma cidade,
mas é como
se eu
andasse descalço
sobre um
depósito de
vidros
quebrados.
Pulsava em
meu sangue
coágulos de
nostalgia
e o desejo
ardente do
corpo
esbarrava num corpo
que,
exaurido, envelhecia.
A calçada é deserta
na extensão
da noite,
e no escuro
a minha
solidão era
a mesma
e se
misturava com
a solidão
das pedras.
Visito em meu roteiro
sem rumo uma
antiga
chácara da
morte, e
era como se
eu entrasse
num canteiro
de obras
ao som de um
sino.
Havia, ao
lado deste
cenário em
que se
morria, um
boi que
pastava,
ruminando
a nossa sina.
Sob
pseudônimo
Estou confinado ao
espaço do eu
mínimo.
Estou de
volta ao
estágio do
ser sozinho,
e se estou
assim não
o estou só
por escolha
própria,
aliás o poeta
Ferreira Jr,
já me disse:
"Excluindo
o homem, o mundo
talvez fosse
belo sem nós".
Estou de
novo no limite
estreito que
nos é devido
e ao qual me
devolveram
como uma
dupla mercadoria
estragada,
com um carimbo
onde se lê:
"Se quiseres
sair do teu
eu insulado e
se neste
gesto tu queimares
alguma
etapa, serás punido
e segregado
do nosso grande
sonho
coletivo".
Do livro Inventário
de sombras (Editora Multifoco). Exemplares esgotados.