Por
Geraldo Lima
Mind
the gap é um livro de contos – alguns são tão curtos que podem ser chamados
de minicontos. É, também, um livro visualmente muito bonito ( cabe, aqui,
ressaltar o belo trabalho de edição da jovem editora Patuá). É, por fim, o livro da escritora, jornalista
e mestre em literatura e crítica literária Vera Helena Rossi. Ela é autora
premiada em concursos literários e tem textos publicados em revistas e sites,
como a Revista Língua Portuguesa e o site Cronópios. Seu romance Estamos todos bem foi finalista do VI
Prêmio da Jovem Literatura Latino-Americana. Ou seja, não estamos diante de uma
escritora inexperiente ou que ainda engatinha na difícil arte de escrever
ficção.
Mind
the gap é composto por dezoito contos. Alguns deles, como já foi dito,
podem ser considerados minicontos. É o
caso de “Eu e você qualquer dia”, “Ninguém dia a dia”, “Narciso” etc. Nesses
textos mais curtos, Vera Helena Rossi parece buscar não a clareza, a
linearidade, a narrativa pura, mas sim a ousadia de situar suas histórias
mínimas nos limites entre os gêneros. Mas é nos textos mais longos que ela
consegue realizar plenamente a construção de uma narrativa que nos revela o
talento de uma autora madura e dona de um estilo próprio. Nesses contos que se
estendem por cinco ou mais páginas, podemos perceber a habilidade da autora na
caracterização psicológica das personagens, na construção dos diálogos e na
sutileza com que conduz a teia narrativa de modo a prender a atenção do leitor
até o final surpreendente. Destacam-se, nessa linha, “As caixas de papelão da família A. Almeida”, “Boa
nova’” (este, para mim, o melhor de todos: vamos até o final cheios de temor e aflição pelo que pode
acontecer aos filhotes de gato) e “Lady Day”, em forma de diário ou simples
desabafo da amante que se dirige ao
amante em tom áspero e irônico. Não ouvimos a voz do amante, apenas o discurso
denso e ácido da mulher contrariada. E é
com frases como esta que ela desnuda a relação com o amante: “Calados, meus solitários gritos, calados. Você devia
me agradecer por ajudá-lo a se encontrar na sua solidão”. Lendo esses contos mais longos, não nos resta
dúvida de estarmos diante de uma escritora que sabe conduzir, sem excessos, uma
boa narrativa.
A temática desses contos (e
minicontos) compostos por Vera Helena Rossi é variada. Temos o caso da velhice
e suas idiossincrasias, em “Boa nova”, do amor e seus conflitos, em “Lady Day”,
até os embates cotidianos, no metrô ou no shopping, como nos são apresentados
em “Assento vazio” e “À vista ou no cartão” (nesse o confronto
físico se dá de fato e com violência
assustadora). Assim, podemos dizer que a
violência se destaca em quase todos os contos de Mind the gap, sendo, de certo modo, o elemento que mantém uma unidade entre os textos . Fora isso, é
bom seguir o que nos diz o título: mind
the gap, ou seja, cuidado com os degraus, ou com os desníveis, no caso
desse livro, preste atenção, caro leitor, à variedade de enfoques, temas e rupturas com a realidade. Num sentido
mais metafórico, à queda cotidiana dos seres que povoam essa obra perturbadora.
mind
the gap
Autora:
Vera Helena Rossi
134
páginas
Patuá
Editora
Preço
R$ 25,00
(venda:
site da editora ou da Livraria Cultura )