Por Ricardo Novais
Casei com um homem mais
velho, bem mais velho. Casei por interesse. Minha mãe foi a única pessoa que
ficou feliz; meu pai me perdeu por causa de dívida, dívida com a máfia italiana
ou da roça mesmo. No Brasil é difícil saber de onde vêm as pessoas, somos uma
família de expatriados.
Nasci em um sítio perto de
Campinas. Aos 9 anos incompletos, fui morar com uma irmã mais velha na cidade.
Terminei meus estudos regulares e então me mandaram para São Paulo. Até os 22
anos de idade eu tinha uma vida muito extravagante, dava para caras endinheirados
por muita grana e morava bem em um apartamento da Alameda Lorena. Eu era
bonita, muito bonita.
Paulo Roberto era velho,
muito velho. Amigo de família, lá dos tempos da roça, um dia ele veio em casa e
jogou uma maleta com oitocentos mil reais na mesa de jantar e um contrato de
casamento. Meu pai estava junto com ele.
- Minha filha querida...
- Saia, papai! Paulo, fique.
Desde então, fiquei ainda
mais bonita; Paulo Roberto, ainda mais velho. Meu pai, morto. Graças a Deus.
Ele perdia muito dinheiro. Em seu leito de morte, a alma de papai foi pesada em
menos de 21 gramas. Minha mãe também já morreu, morreu feliz. Paulo Roberto foi
amante de mamãe, talvez por isto ela sabia que ele me faria feliz.
- Emanuelle, meu amor será
teu escravo.
- Sim, estou protegida ao seu
lado. Obrigada.
Tenho um filho. O filho é do
Edu, mas Paulo Roberto pensa que é dele. Que velho burro! Várias vezes ele já
me pegou na cama com outros homens e até mulheres, mas só diz: “Deus perdoa”.
Paulo não é Deus, é meu pai biológico.
Deus não joga dados fora,
diria algum leitor com ares de cientista. Eu acredito em Deus. Por isto não
tenho remorso de nada, Deus perdoa tudo. Eu posso trair, enganar, roubar; Paulo
pode trair, enganar, roubar e até matar; Deus perdoa, e isto é tudo.
A minha vida é muito boa. Sou
uma mulher de 33 anos que não conhece varizes nem limite de cartão de crédito.
Encontrei a partícula de Higgs, não vou à igreja, ouço Alice in Chains e tenho
hora marcada na sessão de yôga toda manhã. Quando Paulo Roberto
morrer, vou abrir uma rede de academias de ginástica.