Mais opiniões sinceras de Kyanja Lee (parecerista, preparadora e revisora) sobre Manicômio, de Rogers Silva >>>
"Com
relação ao Cap. VIII, d’O espelho,
penso que a narrativa envolvendo o Curioso-Mor e o Curioso-menor em suas
viagens ao passado e ao futuro até poderia ser encarado como um conto autônomo,
com título. Excelente a passagem mencionando os escritores. Humor ferino,
sarcástico na medida certa:
__ Como deve ter
percebido, tenho uma queda para os escritores. São, quase todos, socialmente
fracassados – não ficam ricos, não fazem sucesso, alguns nem são minimamente
reconhecidos. Muitos deles chegam aos seus últimos anos de vida frustrados e
magoados. Porém se acham, quase todos, uns semideuses. Consideram-se
importantes, inteligentíssimos, até geniais. Deles, do seu interior, se
enxergam muitas coisas.
(...) Mas, como diz uma
música que ainda será composta por Belchior, pense comigo: um rapaz
latino-americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes, vindo do
interior (da periferia de uma cidade do interior), com pais sem estudo, e
pobre... A possibilidade de um indivíduo desses se dar bem como escritor ou
qualquer outra coisa que seja é, no Brasil, remotíssima, quase inexistente. Tá
vendo aquele ali?
Grandiloquente
a sua intervenção na narrativa, ao fazer uso de si mesmo como autor, para se
atribuir uma responsabilidade:
− Então... Preste
bastante atenção: Rogers Silva, o rapaz que acabamos de visitar, é o autor d’O
espelho, em cujo capítulo VIII foi criada
a máquina-fuhrer...
− Quê?!
− Pois é... A
máquina-fuhrer, essa mesma que estamos usando, criação de Rogers Silva, vai ser
a grande motivação pro início da Guerra.
− Como?!
− Isso mesmo. Esta
máquina é a responsável por tudo o que você viu. Vai ser (foi) o causador de
todos os males: das mortes, das perseguições... E o criador dela, Klaus
Hoffman, é personagem de Rogers Silva. Sendo assim, o verdadeiro culpado dessa
Grande Guerra, em que milhões serão (foram) mortos, é este rapaz, que nascerá
(nasceu) daqui a cinquenta anos.
Outra
coisa de que gostei foi de seus experimentalismos com a linguagem e com o
projeto gráfico, ao brincar com as palavras de maneira a mostrarem a intenção:
Pulou.
E foi caiiiindo,
caiiiindo,
caiiiindo,
caiiiindo,
TUMMMMMM!!! – um assombroso som seco.
Ou:
Não sabia se rhi hi ria
ou se chorai ai aiva.
E:
oqueserá?
comsuador não... meescutará afasta... DOIS! afasta... demim o maisdepressapossível
essecálice e-e o que-o-que... UM!
E o que
será visto:
somente
os meus cacos
espalhados
pelo chão...
TRIMMMMMMMMMMMMMMMMMM!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
A última revolta de
Jesus Cristo
é uma narrativa curta, mas acaba amarrando com êxito a longa narrativa de O espelho, uma vez que é quase
interlocutor deste último.
Uma
viagem esplêndida me conquistou com a improvável interação de tantos
personagens díspares, de Odin a Chico Bento. Fico me perguntando se a Parte 2, quando se inicia o relato
dessa interação (uma vez que a Parte 1 diz respeito ainda à canção do
adolescente suicida como narrador, que aparece em Uma viagem ruim) não poderia substituir Meus olhos verdes em suas oficinas de contação de histórias. Fica
aí a minha sugestão, para sua análise.
Enfim,
essas são as impressões que me passou a sua longa narrativa, que, como você
mesmo disse, contempla um período grande de produção: de 2002 a 2006, com
algumas interrupções no meio. Entendi que o seu objetivo não é fazer um texto
pasteurizado ou se dirigir a um leitor pouco afeito a leituras densas. Certo?
Sucesso
na publicação de seu livro!"
* Em breve, o livro Manicômio será publicado!