28 de jun. de 2012

Porão do Manicômio (final)

Mais opiniões sinceras de Kyanja Lee (parecerista, preparadora e revisora) sobre Manicômio, de Rogers Silva >>>



"Com relação ao Cap. VIII, d’O espelho, penso que a narrativa envolvendo o Curioso-Mor e o Curioso-menor em suas viagens ao passado e ao futuro até poderia ser encarado como um conto autônomo, com título. Excelente a passagem mencionando os escritores. Humor ferino, sarcástico na medida certa:

__ Como deve ter percebido, tenho uma queda para os escritores. São, quase todos, socialmente fracassados – não ficam ricos, não fazem sucesso, alguns nem são minimamente reconhecidos. Muitos deles chegam aos seus últimos anos de vida frustrados e magoados. Porém se acham, quase todos, uns semideuses. Consideram-se importantes, inteligentíssimos, até geniais. Deles, do seu interior, se enxergam muitas coisas.
(...) Mas, como diz uma música que ainda será composta por Belchior, pense comigo: um rapaz latino-americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes, vindo do interior (da periferia de uma cidade do interior), com pais sem estudo, e pobre... A possibilidade de um indivíduo desses se dar bem como escritor ou qualquer outra coisa que seja é, no Brasil, remotíssima, quase inexistente. Tá vendo aquele ali?

Grandiloquente a sua intervenção na narrativa, ao fazer uso de si mesmo como autor, para se atribuir uma responsabilidade:

− Então... Preste bastante atenção: Rogers Silva, o rapaz que acabamos de visitar, é o autor d’O espelho, em cujo capítulo VIII foi criada a máquina-fuhrer...
− Quê?!
− Pois é... A máquina-fuhrer, essa mesma que estamos usando, criação de Rogers Silva, vai ser a grande motivação pro início da Guerra.
− Como?!
− Isso mesmo. Esta máquina é a responsável por tudo o que você viu. Vai ser (foi) o causador de todos os males: das mortes, das perseguições... E o criador dela, Klaus Hoffman, é personagem de Rogers Silva. Sendo assim, o verdadeiro culpado dessa Grande Guerra, em que milhões serão (foram) mortos, é este rapaz, que nascerá (nasceu) daqui a cinquenta anos.

Outra coisa de que gostei foi de seus experimentalismos com a linguagem e com o projeto gráfico, ao brincar com as palavras de maneira a mostrarem a intenção:
Pulou.
E foi caiiiindo,
caiiiindo,
caiiiindo,
caiiiindo,
                                                         TUMMMMMM!!! – um assombroso som seco.

Ou:

Não sabia se rhi hi ria ou se chorai ai aiva.

E:

oqueserá? comsuador não... meescutará afasta... DOIS! afasta... demim o maisdepressapossível essecálice  e-e o que-o-que... UM!

E o que

será visto:

somente

os meus cacos

espalhados

pelo chão...

TRIMMMMMMMMMMMMMMMMMM!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

A última revolta de Jesus Cristo é uma narrativa curta, mas acaba amarrando com êxito a longa narrativa de O espelho, uma vez que é quase interlocutor deste último.
 Uma viagem esplêndida me conquistou com a improvável interação de tantos personagens díspares, de Odin a Chico Bento. Fico me perguntando se a Parte 2, quando se inicia o relato dessa interação (uma vez que a Parte 1 diz respeito ainda à canção do adolescente suicida como narrador, que aparece em Uma viagem ruim) não poderia substituir Meus olhos verdes em suas oficinas de contação de histórias. Fica aí a minha sugestão, para sua análise.
Enfim, essas são as impressões que me passou a sua longa narrativa, que, como você mesmo disse, contempla um período grande de produção: de 2002 a 2006, com algumas interrupções no meio. Entendi que o seu objetivo não é fazer um texto pasteurizado ou se dirigir a um leitor pouco afeito a leituras densas. Certo?
Sucesso na publicação de seu livro!"


* Em breve, o livro Manicômio será publicado!