Por Ricardo Novais
A coisa mais extraordinária eu assisti na calçada da praça do centro. Um mendigo estrebuchava, tossia e ria; de um riso débil e constrangedor. Toda a gente estava ali, em plateia burlesca e sorridente, mas as pessoas paravam rapidamente, apressadas que são pelas tarefas cotidianas da indiferença humana. O sol, já alto entre arranha-céus, espantou a garoa e fervia incolor a lama que servia de esquife ao moribundo. A cidade, tão grande e até generosa, deu-lhe de esmola esplêndido leito de morte.
Rudes bocas maledicentes que circundavam o pobre projeto de cadáver iniciaram um burburinho, a saber:
- Que tem ele?
- É cachaça! – gritou uma calça risca-de-giz.
- É droga! – retrucou um par de ancas de vestido curto.