Roberto Piva, poeta genial e contundente, nascido em 1937 na cidade de São Paulo, onde sempre viveu, autor de uma obra que só agora começa a ser realmente valorizada, faleceu no dia 03 de julho, depois de um longo período internado no Instituto do Coração.
O BULE, na intenção de contribuir para um maior reconhecimento da obra do poeta paulistano, convidou alguns escritores para lhe prestar um tributo, seja com um poema-homenagem, seja com um breve depoimento sobre ele ou sua obra. A quantidade de textos que nos chegou foi grande, prova da admiração de todos por Piva, o que nos obrigou a dividir o tributo em duas partes: na primeira, postaremos os depoimentos e, na segunda, os poemas-homenagem. Em cada uma dessas postagens, publicaremos um poema de Piva, retirado do livro Paranoia, que teve uma primeira edição em 1963, pela Massao Ohno, e uma segunda em 2000, pelo Instituto Moreira Salles. A seguir, indicamos alguns links onde o leitor pode acessar textos e vídeos sobre o autor e sua obra.
Bom mergulho no delírio poético e visionário de Roberto Piva.
Os Editores
O BULE, na intenção de contribuir para um maior reconhecimento da obra do poeta paulistano, convidou alguns escritores para lhe prestar um tributo, seja com um poema-homenagem, seja com um breve depoimento sobre ele ou sua obra. A quantidade de textos que nos chegou foi grande, prova da admiração de todos por Piva, o que nos obrigou a dividir o tributo em duas partes: na primeira, postaremos os depoimentos e, na segunda, os poemas-homenagem. Em cada uma dessas postagens, publicaremos um poema de Piva, retirado do livro Paranoia, que teve uma primeira edição em 1963, pela Massao Ohno, e uma segunda em 2000, pelo Instituto Moreira Salles. A seguir, indicamos alguns links onde o leitor pode acessar textos e vídeos sobre o autor e sua obra.
Bom mergulho no delírio poético e visionário de Roberto Piva.
Os Editores
BREVES DEPOIMENTOS
Piva, sua poesia, a primeira trombeta do apocalipse.
(Carlos Emílio Barreto Corrêa Lima, escritor)
O gavião de penacho voa para o desconhecido. Viva Piva. Abraços poéticos.
(Reynaldo Bessa, violonista, compositor, cantor e escritor)
Piva se foi. Mas permanece através da poesia, da sua enorme contribuição cultural, e de seus amigos.
(Claudio Willer, poeta e ensaísta)
Roberto Piva: O Horror Literário Contra o Esgoto Social no Pântano da Condição Humana.
(Silas Corrêa Leite, poeta)
A merecida atenção que a poesia de Roberto Piva começa a ter é prova de que a história da poesia brasileira nos últimos 50 anos precisa ser reescrita.
(Affonso Romano de Sant’Anna, poeta, cronista e ensaísta)
Piva, autor de um dos mais belos livros de poesia alucinada, São Paulo na veia, Paranóia e as fotos, poema-imagem.
(Italo Moriconi, professor e poeta)
Nosso Piva se foi, estamos todos de luto. Anos atrás, quando morreu meu filho, ele me ensinou a dizer: não há o que lamentar. Foi uma vida plena, erguida em poesia. Que revive em nós.
(Carlos Felipe Moisés, poeta)
A obra poética de Roberto Piva merece um estudo mais aprofundado em todos os aspectos, sob um olhar amoral, que foge das regras das ciências e da academia. Seus poemas instigantes e provocadores fazem refletir sobre os mecanismos de controle do Homem na sociedade.
(Rubens Shirassu Jr., escritor e cronista)
Pensar e falar algo de mestre Xamã Piva é complicado. Vou ficar sempre com a lembrança dele lendo ao telefone um poema inédito. Eu: um aprendiz. Ele ali falando o poema. É o sonho poético de qualquer leitor/admirador. É complicado, mas ele está alçando voos maiores na poesia cósmica.
(José Geraldo Neres, poeta)
Roberto Piva era a inquietação em pessoa. Criou versos com imagens que me impressionaram profundamente. Um exemplo: “arcanjos de enxofre bombardeiam o horizonte através dos meus sonhos”. E o homem não gostava de escrever. Sentia febre e mal-estar depois da incorporação. Para Piva, se Freud não tivesse existido as pessoas andariam pelas ruas arrancando seus próprios olhos. Era um xamã sábio e ilustrado. Evoé!
(Edson Cruz, poeta e editor)
Piva, o poeta que quebrou todos os paradigmas, vendo beleza e sensualidade nos meninos e garotos quando todos, sufocados pelo heterocentrismo, só têm olhos para a mulher. Ele olhou o garoto, provou de sua carnalidade e desta experiência forjou sua poesia com acento surrealista, barroco, absurdo. Sua coragem de enfrentar os modelos estabelecidos é uma lição de vida para quem prende-se a tabus idiotas. Ele viverá por esta coragem, por sua poesia inovadora.
(Paulo Venturelli, professor e escritor)
A marginalidade consequente foi a tônica da vida e da obra de Roberto Piva. Diferentemente daqueles incensados marginais da poesia e da prosa, que não passam de produto de um modismo ou de uma histeria pequeno burguesa para atrair a atenção da mídia ou de uma esquerda deslumbrada e alcoólica, Piva era um escritor apenas comprometido com a verdade estética: antípoda do mercado, das facilidades editoriais e do sistema de compadrio e vasos comunicantes que tanto vicia a crítica e as redações. Sua poesia refletia um consciente descontentamento com o mundo e as instituições (família, estado, moral, igreja, sociedade), transitava na contramão das escolas, dos movimentos, dos guetos e das irmandades literárias bem comportadas. Visceral, denso, intenso e tenso, Roberto Piva navegou na alucinada, mas lúcida, viagem de uma palavra que não admite qualquer tipo de concessão, senão ser espelho de nossas inquietações e canal de expansão onírica e expressão de um desconforto íntimo, de uma inquietação existencial, de um atávico questionamento filosófico diante do seu (nosso) deslugar nesse tempo e mundo coisificados, banalizados e sedentários, que tanto massificam e mumificam. Da mesma altura de um Rimbaud, de um Blake, de um Breton, de um Genet, de um Artaud, Roberto Piva iluminou o universo reacionário e fetichista da literatura brasileira com seu facho inconformado, mostrando a poesia que há na miséria e nos subúrbios geográficos e psicológicos. Como viveu e escreveu, ele queria “a destruição de tudo que é frágil:/ cristãos fábricas palácios/ juízes patrões operários".
(Ronaldo Cagiano, resenhista e escritor)
Li a poesia de Roberto Piva, pela primeira vez, na antologia 26 poetas hoje, lançada em 1976. Relendo agora os poemas de Piva publicados nesse livro, constato que, dos poetas brasileiros que conheço, ele terá sido o que levou às últimas consequências - isto é, à desagregação da referencialidade, ao abandono do pé de apoio no real - a escrita automática proposta pelos surrealistas. Uma década mais tarde, li a sua Antologia poética, organizada pelo próprio. Dessa vez, procurei deliberadamente, nesses poemas, estímulo para me liberar um pouco do pendor lógico, do metro mental que, achava eu, poderia limitar o que escrevia ou viesse a escrever. Acabo de reler a Antologia também. Confesso que, diferentemente de Piva, não sou hoje, como talvez nunca tenha sido, contrário a "todas as Ordens", como ele declara ser em breve "Biografia" ao final do volume. Vivemos na desordem, não na ordem - esta só se poderá alcançar de maneira pactuada, coletiva, coisa de que ainda estamos longe. A desordem travestida de ordem, na qual pastamos, é, ela sim, autoritária. Sem querer ser conciliatório, mas falando francamente, compreendo que necessitamos de autores como Roberto Piva para que o pendor à ordem - à simetria, às ideias claras - não se torne autoritário, restritivo, mesquinho. Reli hoje, com admiração, os seus poemas, que só aparentemente prescindem de organização estética. É preciso acrescentar que se trata de um grande escritor?
(Fernando Marques, jornalista e escritor)
UM POEMA DE PIVA
POEMA SUBMERSO
Eu era um pouco da tua voz violenta, Maldoror,
quando os cílios do anjo verde enrugavam as
chaminés da rua onde eu caminhava
E via tuas meninas destruídas como rãs por
uma centena de pássaros fortemente de passagem
Ninguém chorava no teu reino, Maldoror, onde o
infinito pousava na palma da minha mão vazia
E meninos prodígios eram seviciados pela Alma
ausente do Criador
Havia um revólver imparcialíssimo vigiado pelas
Amebas no telhado roído pela urina de tuas borboletas
Um jardim azul sempre grande deitava nódoas nos
meus olhos injetados
Eu caminhava pelas aleias olhando com alucinada ternura
as meninas na grande farra dos canteiros de
insetos baratinados
Teu canto insatisfeito semeava o antigo clamor dos
piratas trucidados
Enquanto o mundo de formas enigmáticas se desnudava
para mim, em leves mazurcas
ONDE ACESSAR TEXTOS E VÍDEOS SOBRE ROBERTO PIVA
(Silas Corrêa Leite, poeta)
A merecida atenção que a poesia de Roberto Piva começa a ter é prova de que a história da poesia brasileira nos últimos 50 anos precisa ser reescrita.
(Affonso Romano de Sant’Anna, poeta, cronista e ensaísta)
Piva, autor de um dos mais belos livros de poesia alucinada, São Paulo na veia, Paranóia e as fotos, poema-imagem.
(Italo Moriconi, professor e poeta)
Nosso Piva se foi, estamos todos de luto. Anos atrás, quando morreu meu filho, ele me ensinou a dizer: não há o que lamentar. Foi uma vida plena, erguida em poesia. Que revive em nós.
(Carlos Felipe Moisés, poeta)
A obra poética de Roberto Piva merece um estudo mais aprofundado em todos os aspectos, sob um olhar amoral, que foge das regras das ciências e da academia. Seus poemas instigantes e provocadores fazem refletir sobre os mecanismos de controle do Homem na sociedade.
(Rubens Shirassu Jr., escritor e cronista)
Pensar e falar algo de mestre Xamã Piva é complicado. Vou ficar sempre com a lembrança dele lendo ao telefone um poema inédito. Eu: um aprendiz. Ele ali falando o poema. É o sonho poético de qualquer leitor/admirador. É complicado, mas ele está alçando voos maiores na poesia cósmica.
(José Geraldo Neres, poeta)
Roberto Piva era a inquietação em pessoa. Criou versos com imagens que me impressionaram profundamente. Um exemplo: “arcanjos de enxofre bombardeiam o horizonte através dos meus sonhos”. E o homem não gostava de escrever. Sentia febre e mal-estar depois da incorporação. Para Piva, se Freud não tivesse existido as pessoas andariam pelas ruas arrancando seus próprios olhos. Era um xamã sábio e ilustrado. Evoé!
(Edson Cruz, poeta e editor)
Piva, o poeta que quebrou todos os paradigmas, vendo beleza e sensualidade nos meninos e garotos quando todos, sufocados pelo heterocentrismo, só têm olhos para a mulher. Ele olhou o garoto, provou de sua carnalidade e desta experiência forjou sua poesia com acento surrealista, barroco, absurdo. Sua coragem de enfrentar os modelos estabelecidos é uma lição de vida para quem prende-se a tabus idiotas. Ele viverá por esta coragem, por sua poesia inovadora.
(Paulo Venturelli, professor e escritor)
A marginalidade consequente foi a tônica da vida e da obra de Roberto Piva. Diferentemente daqueles incensados marginais da poesia e da prosa, que não passam de produto de um modismo ou de uma histeria pequeno burguesa para atrair a atenção da mídia ou de uma esquerda deslumbrada e alcoólica, Piva era um escritor apenas comprometido com a verdade estética: antípoda do mercado, das facilidades editoriais e do sistema de compadrio e vasos comunicantes que tanto vicia a crítica e as redações. Sua poesia refletia um consciente descontentamento com o mundo e as instituições (família, estado, moral, igreja, sociedade), transitava na contramão das escolas, dos movimentos, dos guetos e das irmandades literárias bem comportadas. Visceral, denso, intenso e tenso, Roberto Piva navegou na alucinada, mas lúcida, viagem de uma palavra que não admite qualquer tipo de concessão, senão ser espelho de nossas inquietações e canal de expansão onírica e expressão de um desconforto íntimo, de uma inquietação existencial, de um atávico questionamento filosófico diante do seu (nosso) deslugar nesse tempo e mundo coisificados, banalizados e sedentários, que tanto massificam e mumificam. Da mesma altura de um Rimbaud, de um Blake, de um Breton, de um Genet, de um Artaud, Roberto Piva iluminou o universo reacionário e fetichista da literatura brasileira com seu facho inconformado, mostrando a poesia que há na miséria e nos subúrbios geográficos e psicológicos. Como viveu e escreveu, ele queria “a destruição de tudo que é frágil:/ cristãos fábricas palácios/ juízes patrões operários".
(Ronaldo Cagiano, resenhista e escritor)
Li a poesia de Roberto Piva, pela primeira vez, na antologia 26 poetas hoje, lançada em 1976. Relendo agora os poemas de Piva publicados nesse livro, constato que, dos poetas brasileiros que conheço, ele terá sido o que levou às últimas consequências - isto é, à desagregação da referencialidade, ao abandono do pé de apoio no real - a escrita automática proposta pelos surrealistas. Uma década mais tarde, li a sua Antologia poética, organizada pelo próprio. Dessa vez, procurei deliberadamente, nesses poemas, estímulo para me liberar um pouco do pendor lógico, do metro mental que, achava eu, poderia limitar o que escrevia ou viesse a escrever. Acabo de reler a Antologia também. Confesso que, diferentemente de Piva, não sou hoje, como talvez nunca tenha sido, contrário a "todas as Ordens", como ele declara ser em breve "Biografia" ao final do volume. Vivemos na desordem, não na ordem - esta só se poderá alcançar de maneira pactuada, coletiva, coisa de que ainda estamos longe. A desordem travestida de ordem, na qual pastamos, é, ela sim, autoritária. Sem querer ser conciliatório, mas falando francamente, compreendo que necessitamos de autores como Roberto Piva para que o pendor à ordem - à simetria, às ideias claras - não se torne autoritário, restritivo, mesquinho. Reli hoje, com admiração, os seus poemas, que só aparentemente prescindem de organização estética. É preciso acrescentar que se trata de um grande escritor?
(Fernando Marques, jornalista e escritor)
UM POEMA DE PIVA
POEMA SUBMERSO
Eu era um pouco da tua voz violenta, Maldoror,
quando os cílios do anjo verde enrugavam as
chaminés da rua onde eu caminhava
E via tuas meninas destruídas como rãs por
uma centena de pássaros fortemente de passagem
Ninguém chorava no teu reino, Maldoror, onde o
infinito pousava na palma da minha mão vazia
E meninos prodígios eram seviciados pela Alma
ausente do Criador
Havia um revólver imparcialíssimo vigiado pelas
Amebas no telhado roído pela urina de tuas borboletas
Um jardim azul sempre grande deitava nódoas nos
meus olhos injetados
Eu caminhava pelas aleias olhando com alucinada ternura
as meninas na grande farra dos canteiros de
insetos baratinados
Teu canto insatisfeito semeava o antigo clamor dos
piratas trucidados
Enquanto o mundo de formas enigmáticas se desnudava
para mim, em leves mazurcas
ONDE ACESSAR TEXTOS E VÍDEOS SOBRE ROBERTO PIVA