8 de mar. de 2010

'Uma escada que deságua no silêncio', de Milton Rezende


Milton Rezende é um poeta do desvelamento. Sua principal característica é enfrentar a objetividade ruidosa e dispersa das coisas, da rotina, do comum e arrancar um sentido novo. Em Uma Escada que Deságua no Silêncio, o objeto limado pelo autor é o território bruto e confuso da memória.
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Dessa forma, o autor evoca o aprofundamento aos temas básicos da condição humana: a solidão, o amor e a morte. Embora recorrentes, é verdade, no caso de Uma Escada que Deságua no Silêncio não pecam pela banalização ou gratuidade sentimentalista; dialogam com emanações da memória de forma dialética e, por vezes, produzem impasses. Nessa batalha o autor atinge o limite possível da expressão poética encarnando densidade, conteúdo e tratamento estético conciso.
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Capa: Guilherme Peres
Foto do autor: R & A Foto e Vídeo
Texto da 4ª capa: Carlos Águia
Revisão: Milton Rezende
Diagramação: Fernanda Hubacher
Editora Multifoco
Editor: Marcos Vinícius Almeida.

Onde comprar:
www.editoramultifoco.com.br/terceiramargem
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Leia abaixo um poema do livro:
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COM UM BERÇO NAS COSTAS
“Ontem, à meia-noite, estando junto
a uma igreja, lembrei-me de ter visto
um velho que levava às costas isto:
um caixão de defunto”.
Alphonsus de Guimaraens (1870-1921).

Depois de muitos anos,
tentando ainda me livrar
das marcas do passado
fui ao cemitério retirar
os ossos do meu amigo.

Lembro-me de ter deixado
uma pedra em formato de
concha, sob a qual estavam
os seus objetos pessoais e
toda a minha lembrança.

Era meia-noite no relógio
da igreja e um velho sentado
cochilava com a sua carcaça
de quem estava prestes a partir
e abandonar de vez a praça.

Antes, porém, seria necessário
àquele velho feio e deformado
atravessar a ponte de concreto
armado e alcançar o outro lado,
onde não havia nada além do pátio.

Surpreendi o velho em sua travessia
quando eu vinha vindo em sentido
contrário e voltando dos bares que
estavam situados na margem oposta,
onde a vida era só queixa e desamparo.

O homem trazia em suas costas
uma caixa de madeira envernizada
e cheia de alças de metal dourado,
semelhante aos caixões que eu via
expostos na porta da casa funerária.

E perguntei-lhe, já meio bêbado,
o que ele carregava nas costas
e se era pesado – disse-me então
e sem olhar para o meu lado,
que ia levando apenas o seu leito.

De súbito, ocorreu-me o fato
e a lembrança que me levara ali:
desenterrar os restos mortais
do meu amigo, depois de passados
alguns anos, conforme combinado.

Mas não sei se fui ao lugar errado:
o certo é que encontrei apenas,
na escuridão da casa dos mortos,
somente uma velha caixa de amianto
e pedaços de tubos galvanizados.
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Sobre o autor:
Milton Rezende nasceu em Ervália (MG), na primavera de 1962. Escreve em prosa e poesia e a sua obra se divide entre inéditos e publicados. Entre estas últimas encontram-se O Acaso das Manhãs (1986), Areia (À Fragmentação da Pedra) (1989), De São Sebastião dos Aflitos a Ervália – Uma Introdução (2006) e Uma Escada que Deságua no Silêncio (2009). Possui inédito o livro A Magia e a Arte dos Cemitérios, para o qual procura editoras interessadas. Exemplares dos seus livros podem ser adquiridos diretamente com o autor através do e-mail: milton.rezende@yahoo.com.br
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Daqui a uma semana (15/03) divulgaremos o contemplado aqui n'O BULE.
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