Por Geraldo Lima
A
rajada de vento apanhou a folha de papel jogada sobre a ponte e a transportou
numa viagem desengonçada por sobre as águas do rio. A mulher acompanhou a trajetória
da folha até não avistá-la mais, talvez tenha caído na água e se dissolvido
toda, pensou. E no mesmo instante desejou ser aquela folha de papel e ser
arrastada pelo vento. Ser, enfim, arremessada contra uma superfície sólida ou
líquida e desaparecer inteira.
Quando
pequena, ela já sentia a vertigem de se imaginar jogando ali do alto da ponte.
O corpo, como um tronco de árvore podre, flutuava por alguns instantes e depois
era arrastado violentamente pela força da gravidade. Sua imaginação febril agia
com tanta perfeição que ela podia ouvir o som da água se esparramando toda em
ondas concêntricas assim que o corpo a tocava.
Uma
árvore de tronco podre, é assim que se sente agora. E está prestes a romper com
as raízes e tombar no vazio. Só espera a próxima rajada de vento colhê-la sem
aviso e delicadeza.