20 de fev. de 2012

O pedido

Por Rafael Cal

ELE está em um bar.
ELA chega.

ELE: Tava preocupado.
ELA: Desculpa o atraso.
ELE: Não tem problema. Acabei de chegar.
ELA: Trouxe os papéis?
ELE: Tão aqui.
ELA: Vi sua irmã ontem.
ELE: Mesmo?
ELA: Disse que a gente não devia.
ELE: Ela devia cuidar da vida dela.
ELA: Também pensei isso.
ELE: É fácil olhar de fora.
ELA: Mas, fiquei pensando no que ela me disse. Talvez ela tenha razão.
ELE: Olha, não me confunde mais. Por favor.
ELA: Pede pra mim.
ELE: O quê?
ELA: Pede alguma coisa.
ELE: Não. Não vamos começar isso de novo.
ELA: Pede alguma coisa ao garçom.
ELE: Ah.
ELA: Tô com fome.
ELE: O que você vai querer?
ELA: Uma taça de vinho.
ELE: Tinto.
ELA: Isso.
ELE: Merlot.
ELA: Exato.
ELE: (com a voz grave) Isso me custou muito caro, sabiam? Mas, o que é o dinheiro, quando estamos falando da vontade da minha menina, não é mesmo? Vocês viram o vestido dela? Mandei aquele viadinho do costureiro comprar o melhor tecido que tivesse na Europa!
ELA: (imitando a voz de um homem) Viram o relógio do noivo? Eu que dei! Aquele lá carrega um apartamento no pulso, graças a mim!
ELE: E o buffet?
ELA: (imitando a voz de um homem) Por mim, eu tinha mandado matar logo uns cinco ou seis bois, uns cabritos, uns dois porcos. Não gosto dessas frescuras de rodelinha de pão com negocinho em cima, não, de torradinha com pastinha. Eu queria mesmo era um puta churrasco! Mas, a mulher diz que não é de bom tom, que não é chique, não é mesmo?
ELE: O seu pai é uma figura.
ELA: Pede logo.
ELE: Tudo bem.
ELA: Pede pra eu ficar.

Rafael Cal - Quando era criança, sonhava em ser cosmonauta, mas acabou escrevendo. O texto, ainda na adolescência, ganhou as páginas de fanzines, jornais, rótulos de palmito e os palcos, como dramaturgia. Hoje, encontra lugar no blog http://fazendoumdrama.blogspot.com/ e, eventualmente, em um ou outro site que acha os textos legais.