17 de fev. de 2011

Entrevista com Esdras do Nascimento - Aperitivos

"Alguém se lembra daquela moça chamada Simone de Beauvoir, como romancista? Nunca teve qualquer importância nessa área, embora tenha se esforçado muito. Chegou a publicar um romance de qualidade pouco abaixo da média, Os mandarins, que fez muito sucesso devido às suas características de documentário jornalístico. Não passou disso. Aparecia muito na mídia, contribuiu para a conquista de alguns direitos das mulheres, ocupa lugar indiscutível na história dessa luta. Mereceu os aplausos recebidos. Deus a tenha. Ou o Diabo. Já que a moça era ateia. Isso nada tem a ver com literatura".
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"Literatura não é comunicação. É expressão. O centro de gravidade da literatura é o texto. Escritor não escreve pensando em público alvo. Quem faz isso é o político, é o jornalista, é o líder religioso. O texto a serviço de uma causa. O texto como instrumento para a conquista de algo: venda de refrigerantes, calcinhas, automóveis. Quem escreve bulas de remédios deve ter mais leitores do que todos os ficcionistas de boa qualidade que estão por aí criando contos, romances, novelas. E deve ganhar boa grana".
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"Escrever, para mim, é uma tentativa de me compreender e de compreender o mundo em que vivo. A criação literária é resultado desse esforço. Meu grande prazer é o percurso, é o avanço da narrativa. O texto precisa avançar, sem dúvida. O fundamental, porém, é que eu avance espiritualmente quando escrevo. Se isso ocorrer, estarei colaborando, na medida das minhas limitações, para que o mundo também se enriqueça. É essa a minha pretensão".
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"Jornalzinho da escola, histórias em quadrinho, rádio, cinema, televisão, internet. Grandes conquistas. Blogs, revistas eletrônicas, e-mails. Quanto mais gente lendo, escrevendo, falando em livros, tanto melhor. No meio desse povo todo, como sempre, haverá redatores, pensando em grana, sucesso, empreendedorismo, essa porcaria toda, e haverá escritores, empenhando a vida pela conquista do rigor no uso da palavra".
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"Literatura não é para contar nada. É para criar mundos novos feitos de palavras. É para deixar Deus morrendo de inveja por não ter criado tantas belezas que foram criadas por exemplo por Elias Canetti ou por Faulkner ou por John Cheever".
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"A palavra autoficção é modismo de idiotice ímpar. Igualzinho a pós-moderno, com certeza, discutir relação, interagir, viés — meu Deus, afaste de mim esse cálice. São expressões e jargões que nascem nas tevês e nos túmulos da pós-graduação universitária para alimentar a ciência da embromática".
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>>> E amanhã, os colunistas d'O BULE entrevistam Esdras do Nascimento, que responderá algumas perguntas impertinentes. Ou não.

>>> Três exemplares do romance A dança dos desejos, opus 13, de Esdras do Nascimento, serão sorteados.